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IA na saúde: mais espaço para um sistema preventivo

A extração e o tratamento dos dados da área de saúde podem gerar economia exponencial para o ecossistema e transformar a vida das pessoas


Prevenir é melhor do que remediar: esse é um ditado popular bastante conhecido, do tempo dos nossos avós. Embora antigo, faz cada vez mais sentido para a área da saúde, onde a importância da prevenção e do diagnóstico e tratamento precoces são inquestionáveis.

 

Se a sabedoria popular é tão óbvia, por que o sistema de saúde não foca na prevenção de doenças em vez do diagnóstico e tratamento tardios? A resposta é simples: porque o sistema não sabe, muitas vezes, que aquele paciente com uma determinada doença existe; quanto o encontra, normalmente é tarde demais.

 

É aí que entra a tecnologia e diversas inovações que já estão sendo conduzidas pela medicina. Atualmente, aproximadamente 30% do volume de dados do mundo tem origem na saúde. Estamos vivendo uma verdadeira explosão de informações: a cada segundo, uma quantidade gigantesca de dados sobre condições de saúde é gerada e extraída. Basta pensar na quantidade de consultas, exames e procedimentos médicos realizados todos os dias no mundo inteiro.

 

Dentro desse turbilhão de dados estão todas as informações necessárias para o sistema de saúde. É aqui que estão todos os pacientes que podem ser tratados de forma preventiva e muito antes de virarem portadores de doenças crônicas ou mesmo falecerem por condições agudas e letais. Os dados em saúde revelam muitos segredos, como a descoberta de futuros doentes, mas também a probabilidade de alta ou óbito entre pacientes internados ou acompanhados ambulatorialmente. Tem sido cada vez mais surpreendente descobrir todas essas informações e poder utilizá-las no ecossistema da saúde em benefício de médicos, demais profissionais do setor e pacientes.

 

Não saber interpretar esses dados pode significar perdas significativas, como um custo muito maior por paciente acompanhado (até cinco ou seis vezes superior), além de maiores morbidade e mortalidade. Tudo isso ocorre porque o momento de detecção tradicional da doença é quando esta já se instalou, tornando-se muitas vezes mais grave e custosa para os pacientes. A boa notícia é que soluções de inteligência artificial (IA) já estão prontas e maduras para antecipar esse momento de identificação da doença, reduzindo sobremaneira os gastos e melhorando o prognóstico e desfecho dos pacientes.

 

Um estudo recente realizado pela startup brasileira NeuralMed, composto por uma população de 10 mil diabéticos, revelou que quando o paciente entra em fase aguda os gastos com o tratamento passam de dois mil reais mensais para um patamar superior a 10 mil reais mensais. Com um programa preventivo e com o auxílio da IA, o custo inicial até pode aumentar por um curto período, porém voltará à normalidade rapidamente e trará redução significativa de custos no médio e longo prazo, com um potencial de economia de milhões de reais.

 

Gráfico comparativo da detecção de doença por métodos tradicionais (momento destacado pela coluna vermelha) e por uma solução baseada em IA (momento destacado pela coluna azul).

 

Sob as lentes da tecnologia, para a prevenção, vemos um filme do paciente; para o tratamento de sintomas, uma única foto isolada. Com a IA jogando a favor do sistema, os futuros pacientes crônicos são encontrados principalmente por meio da análise de dados de outras doenças e acometimentos ao longo do seu histórico de saúde, além das medicações já prescritas, pelas menções em exames de texto não estruturados e em outros documentos médicos. Isso é o que chamamos de saúde personalizada e de precisão – tão desejada por todos e com imensos benefícios para todos os atores do ecossistema da saúde, especialmente para os pacientes.

 

Em resumo, o sistema de saúde precisa parar de trabalhar como funilaria, reparando defeitos, e investir em autoescola, com foco na educação, detecção e tratamento precoces. Atualmente, levando-se em conta esta analogia, insistimos em consertar os carros avariados, a um custo bem maior e com menor chance de reparos bem sucedidos, enquanto deveríamos ser muito mais cuidadosos e alertas com os primeiros sinais de desgaste. Com o auxílio dos dados tratados pela IA, iremos, enfim, assistir ao tratamento cedendo lugar para a prevenção. Não se trata mais de um desejo, mas de uma realidade possível e animadora.

 

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Artigo escrito em parceria com Anthony Eigier, formado em Economia pela Northwestern University, fundador de uma aceleradora de startups em 2012 e, após isso, co-fundador de uma startup de jogos para celular, que hoje é uma das maiores empresas do setor no Brasil. Atuou em um grupo de radiologia desenvolvendo novos negócios e procurando maneiras de melhorar a produtividade. Atualmente é CEO e fundador da NeuralMed, startup que desenvolve soluções de auxílio à triagem e fluxo de pacientes nas instituições de saúde, utilizando a IA para analisar imagens e textos médicos. Publicado na coluna de outubro de 2022 da MIT Sloan Management Review Brasil.